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Esgotamento: você está vivendo a sua vida em um "scroll infinito"?

Hora do Café

Edição N.º 17 - Junho 2022

Na maioria das instituições de educação, todo o fim de semestre é o mesmo cenário: enquanto estudantes se sentem pressionados com as entregas de trabalhos e com as provas de conclusão de período, a sala da docência se torna um ambiente regado a açúcar e café, repleto de pessoas cansadas, sobrecarregadas e, muitas vezes, frustradas com a profissão que escolheram. Você já presenciou uma escola assim? Apesar de junho ser o mês da festa junina, haja quentão para aquecer o coração de quem tem 400 redações para corrigir em um fim de semana. 


Não é por acaso que o termo “Burnout” está em alta nos últimos anos. A tal Síndrome de Burnout, também conhecida como a Síndrome do Esgotamento Profissional, é um distúrbio emocional que se apresenta através da exaustão extrema, o estresse e o esgotamento físico, resultantes de situações de trabalho desgastante, que demandam muita competitividade ou ainda muita responsabilidade. Ou seja, essa é a condição que pode acometer aquela pessoas que ficam “doentes de tanto trabalhar”. Já se sentiu assim?


Mesmo para quem jamais recebeu o diagnóstico de Burnout, um sentimento de esgotamento pode ser familiar. Para falar sobre o assunto, chamamos o psicólogo Rafael Michel Domenes, mestre em Psicologia Social pela PUC-SP, para nos dizer: afinal, se todos nós temos estado mais com mais exaustão nos últimos anos, como perceber que estamos chegando ao limite do nosso cansaço? 



Distanciamento do trabalho é sinal de esgotamento


“É difícil, porque isso é muito singular. Cada pessoa sabe o seu próprio limite — ou não, a gente torce para que saibam”, responde o psicólogo. “As pessoas que se esgotam começam a notar, no seu cotidiano, uma persistente falta de motivação para o trabalho, uma falta de interesse… No caso dos professores da rede pública, com os quais eu tenho experiência, percebo um certo distanciamento com o trabalho, com as crianças, e uma dificuldade de acessar a criatividade e a inventividade, que antes lhes eram tão acessíveis”, afirma.

A vida em um infinito scroll 

Você já percebeu que, nas redes sociais, existe uma técnica que permite que o usuário continue rolando por uma infinidade de conteúdos sem precisar, em nenhum momento, apertar nenhum botão, reagir ou absorver de fato uma publicação? Essa técnica é denominada de “scroll infinito”, pois a linha do tempo nunca chega ao final: sempre há mais e mais conteúdo a ser observado, mesmo que a pessoa usuária nada faça em relação a ele. 

Segundo Rafael, muitos de nós estamos vivendo uma vida semelhante à dinâmica de scroll infinito das redes sociais, só que na vida real. “A gente vai vivendo a vida sem intervalos, sem vãos, automaticamente, e sem tempo para absorver nada que nos acontece”, afirma. “Isso causa uma sensação de perenidade, em que todos os dias parecem o mesmo e isso serve para fomentar o estresse também. É como se o estresse fosse normalizado e, presente todos os dias, se tornasse parte da nossa vida”, continua. “Acontece que os vãos, as pausas, são importantes para a saúde mental”, conclui. 

Com o trabalho remoto, o que o nosso profissional da saúde chama de perenidade ficou ainda mais evidente. “Em alguns empregos, o que é tido como horário flexível é, na verdade, um horário interminável. As pessoas estão indo para a cama enquanto trabalham pelo celular. Sem interrupções, é natural que exista essa questão do esgotamento”, pontua Rafael. “E o mercado é cruel: se você não der conta da pressão e do excesso de trabalho, tem outra pessoa na fila, pronta para tomar o seu lugar. Temos contas a pagar, muito desemprego, então é uma situação difícil de lidar”, avalia o psicólogo.

“Tenho visto que, para algumas pessoas, não há alternativas. Essas situações perduram e elas adoecem, é triste”, afirma Rafael. “O que eu consigo imaginar como saída é um movimento coletivo. Contrário ao que é esperado da gente. Afinal, como efeito dessa correria toda, a gente percebe um individualismo maior. Mas, quanto mais pudermos estar juntos, até para reivindicar mudanças, melhor para todos nós”, incentiva o psicólogo.

“Um dia, escutei uma frase muito complicada de um professor e isso me tocou demais. Bastante envolvido com a militância, ele disse: ‘estamos condenados a lutar’. E eu achei tão forte essa ideia de ‘condenado’, sabe? Que sem saída é isso! Será que é por aí?”, questiona. “E essa não é uma fala que surge só do indivíduo, é de toda a estrutura que hoje permeia a educação”, aponta Rafael. 

Enfim, que o Fique Bem seja um espaço para nos ouvirmos, nos acolhermos, nos unirmos e nos ajudarmos. Que seja também um espaço de militância, mas que seja leve e livre, não aprisionante. O que acha? Deixe seu comentário e vamos pensar em como podemos seguir construindo essa rede de apoio que tanto ajuda professores de todo o Brasil desde 2020, e que busca atenuar as dores e frustrações de quem já esteve ou está perto do esgotamento profissional na área da educação.

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