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Burnout entre professores reflete urgência de novas estratégias de cuidado e retenção no RH das escolas

Para especialista, o problema começa no mito de que o professor é um super-herói e se reproduz na falta de respeito pelos limites físicos e emocionais do educador

Hora do Café

Edição N.º 29, Junho de 2023

Nas últimas semanas, veio a público a notícia de que um em cada três professores da educação básica está sofrendo com a síndrome de burnout. A pesquisa foi feita pelo Instituto de Saúde e Sociedade da Universidade Federal de São Paulo (ISS-Unifesp) e contou com a participação de 397 professores e professoras distribuídos por diversos estados brasileiros e provenientes de escolas públicas e privadas. Segundo o estudo, 43,58% dos educadores entrevistados apresentaram burnout relacionado ao trabalho —  sentimentos de exaustão e frustração intimamente ligados à rotina laboral e às limitações que ela impõe em sua vida pessoal. Como essa notícia chega até você?


Consultados pelo Fique Bem, os professores da nossa rede disseram que, neste mês de junho, o que mais os preocupa na rotina escolar é a sobrecarga de trabalho. Não é surpresa que, no final de semestre, essa seja a principal preocupação dos nossos colegas, mas será que essa sobrecarga está de acordo com o que era esperado para esse ano? Em um contexto de pós-pandemia, violência e constante desvalorização do setor, a educação parece estar sempre mais desafiada que o “combinado”, né?


Para conversar sobre esse assunto, nossa redação chamou o psicólogo e profissional de Recursos Humanos, Silas Maia. Há sete anos, ele atua com recrutamento, seleção, retenção e desenvolvimento de pessoas. “No aspecto do contrato de trabalho, a gente precisa entender o professor como um contratado; e a instituição escolar como uma empresa contratante. Quando falamos em empresas maiores, existe uma estrutura, um suporte financeiro para proporcionar um time maior e menor sobrecarga. Quando falamos de startups, empresas familiares, isso muda totalmente. Com qual cenário se compara a sua escola? Se for uma escola particular, como ela faz essa gestão dos colaboradores?”, provoca Silas. 



Psicólogo e profissional de Recursos Humanos, Silas Maia.


“Uma estratégia que eu adquiri como profissional de RH é a de alinhamento da expectativa dos dois lados. É preciso entender e observar se o acordo feito na hora da contratação segue sendo respeitado meses, anos depois. Esse é um assunto que o RH, ou seja quem estiver fazendo esse papel de cuidado com as pessoas, não pode temer. É preciso ajustar o que está dentro do escopo do colaborador, ou do professor, para que a gente não perca um talento, ou ainda pior, não cause o adoecimento dessas pessoas”, continua.


“Eu tenho duas professoras na minha família e recebo relatos de experiências que, se você é da Psicologia e for observar, é nítido: em algum momento, se nada for feito, vai dar game over. Ou seja, vai cair no burnout, vai adoecer, ou vai se distanciar da escola”, revela Silas. Você já se viu ou viu algum colega nessa situação? Não deixe de compartilhar suas experiências na sala de aula. “E o que pode ser feito? Novamente, é importante envolver na discussão aquela pessoa responsável por ter trazido esse professor para a instituição. É preciso que o pessoal do RH ou o gestor responsável por esse professor interceda por um psicólogo pra acompanhar as pessoas”, defende o especialista. 


“Terapia hoje não é um luxo. Cuidar da saúde mental é tão grandioso quanto cuidar da saúde física. Talvez a saúde física seja mais escancarada. Se você torce o pé, depois você começa a ter dificuldade para andar, porque tem uma coisa que precisa ser observada. A saúde mental vai demorar um pouco mais para te dar esses indícios de que tem alguma coisa acontecendo, mas ela precisa, igualmente, de atenção”, reforça.


Ninguém é super-herói na educação


O psicólogo aproveita para se posicionar de forma contrária àquele mito de que o professor é um “super-herói”. Para ele, o problema começa quando o próprio educador acredita em uma suposta hiperimunidade ou em uma altíssima capacidade de lidar com desafios, e evita buscar ajuda ou respeitar os próprios limites. 


“Existe uma responsabilização do professor, que ele começa a acreditar que é tudo com ele mesmo, que ele está sozinho. ‘Eu desenvolvo, eu tenho que, preciso dar conta…’, é como se fosse um super-herói, mas ele não é. Esse é o primeiro olhar que precisa ser reforçado. Simultaneamente, entendido que o professor precisa de ajuda, é preciso oferecer essa ajuda, e isso se dá com o psicólogo dentro da instituição, um canal de confiança”, afirma.


“Com autoconhecimento, você vai entender qual é o momento de levantar a mão e pedir auxílio profissional, mas você precisa ter esse auxílio disponível”, reforça. “Preciso de um terapeuta. Preciso de alguém pra me escutar. Preciso de alguém pra me direcionar. Vai ter momentos que eu não vou conseguir lidar sozinho. Então, a gente precisa de ajuda. É comum e natural”, levanta. 


“Quanto mais a gente naturalizar isso, quanto mais falarmos de saúde mental e quanto mais a gente introduzir isso no meio que a gente vive, mais ganhamos. Eu não consigo ver nenhum ponto negativo em levar a saúde mental em consideração. Eu só consigo ver ganhos para todos. Ter um profissional com uma saúde emocional equilibrada, um profissional capaz de conseguir entender os seus limites, é valioso e deveria ser o objetivo de qualquer gestor”, conclui Silas Maia.


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