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Pelo respeito à arte e à educação física no ensino fundamental

Caneta Vermelha

Edição N.º 13 - Fevereiro de 2022

Todas as disciplinas que integram o currículo escolar têm sua importância no desenvolvimento do estudante. Cada uma delas possui um objetivo diferente e, a partir de desafios específicos, colabora para a formação pessoal, cidadã, profissional e acadêmica dos alunos. Portanto, embora algumas pessoas ainda, em 2022, confundam as disciplinas relacionadas à manifestação da arte (Teatro, Dança, Música e Artes Visuais) com atividades de recreação ou passatempo, é importante ressaltar a importância da educação artística na escola. E o mesmo argumento cabe à disciplina de Educação Física. 

No Caneta Vermelha deste mês, queremos não somente realinhar com os nossos leitores a necessidade de valorizarmos os profissionais especializados nessas áreas — e entendermos a relevância dessas disciplinas no currículo escolar — , como também lançar luz a uma pauta que tem movimentado professores e coletivos ligados à educação, às Artes e à Educação Física em Salvador, na Bahia.


No início de fevereiro, a prefeitura da capital baiana anunciou a substituição de professores especialistas por pedagogos nas disciplinas de Educação Física e Artes. A mudança afeta, em um primeiro momento, as turmas de 1° e 2° ano do ensino fundamental. A medida, que vem sendo amplamente criticada pelos professores e pelos coordenadores das escolas, surgiu sem diálogos prévios com a categoria, sem nenhuma assinatura de documento ou decreto, e sob a justificativa de contenção de custos, o que implicaria em um remanejamento dos professores. 





Em nota oficial enviada à imprensa, a Secretaria Municipal de Educação de Salvador afirma que a medida foi tomada para liberar “professores especialistas de Artes e Educação Física para atender às necessidades dos alunos dos anos seguintes, para os quais não há substitutos”. Contudo, quem é da área da educação garante que a falta de professores especialistas, já nos anos iniciais do ensino fundamental, pode causar prejuízos na alfabetização dos estudantes. Inclusive, uma das críticas ao secretário municipal da Educação, Marcelo Oliveira, é a de que ele não teria a qualificação necessária para assumir a pasta. Oliveira é engenheiro eletricista e assumiu o cargo na prefeitura em janeiro de 2021. 

“Ele não tem nenhum traquejo para lidar com educação, ele é um empresário. Para ele, Educação Física e Artes são recreação e desenho livre”, afirma a professora e pesquisadora Liz Novais, que é mestre em Artes Cênicas e professora de Teatro na rede municipal de ensino. “Ele tem algumas metas de alfabetização para cumprir e acredita que esse processo pode suprimir essas matérias. Como se letramento e alfabetização não passassem pelo corpo, não passassem pelas experiências culturais vividas em comunidade e pela relação de sociabilidade que se estabelece entre as crianças, escola e familiares”, pontua.

 

“A alfabetização passa pela compreensão do corpo como linha de frente, pela compreensão da linguagem atrelada a esse corpo, da linguagem que respeita a territorialidade desse corpo, pelos aprimoramentos da sociabilidade que se tem, das conquistas motoras, psicossomáticas, enfim… Uma sequência de valores que estão ligados à existência dessas disciplinas”, continua Liz. “Não é à toa que elas foram apontadas como disciplinas que precisam ser obrigatórias no ensino fundamental”, conclui a professora.

Sob esse contexto, manifestações e paralisações foram organizadas por grupos, como o Coletivo de Professoras e Professores da Rede Municipal de Salvador. Os professores já receberam apoio da Associação Brasileira de Artes Cênicas (ABRACE), do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB), da Universidade Federal da Bahia (UFBA), dos próprios estudantes e dos seus pais, mas seguem sem um acordo com a secretaria.

Para a pasta, em contradição ao que acusam os protestos, o remanejamento de professores deve beneficiar tanto os estudantes quanto os docentes. “Essa mudança vai trazer grandes benefícios para os alunos do 1° e 2° ano, que terão dois professores pedagogos com uma carga horária maior, trazendo maior facilidade de interação e integração com esses alunos”, diz a secretaria em nota. “Os professores de Artes e Educação Física que ministravam suas aulas nas turmas de 1° e 2° ano serão alocados nas turmas dos anos mais adiantados, nas quais serão muito melhor aproveitados e poderão demonstrar todo seu potencial pedagógico”, continua o texto, que finaliza reafirmando que a alteração não trará “qualquer prejuízo para os alunos ou professores”.

 

Salvador foi uma das primeiras cidades do Brasil a adotar o concurso público artístico para professores, enquanto a tradição nacional ainda era o concurso por polivalência. Logo, a demarcação da arte como área de conhecimento faz parte da história do município. Assim, a decisão de tirar os professores especialistas dos primeiros anos do ensino fundamental é tomada por muitos professores como um grave retrocesso. “A gente tenta lutar para que isso não abra precedentes para o Brasil inteiro”, diz a professora Liz. “Temos três vereadores que estão trabalhando ativamente nessa questão, mas a comissão de Educação da Câmara dos Vereadores é de maioria de coligados do partido do secretário e prefeito, assim como a grande mídia em Salvador tem viés partidário. Dessa forma, fica difícil articular politicamente”, conclui.

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